O programa CQC, Custe o Que Custar, da Band é um formato importado da Eyeworks-Cuatro Cabezas e inspirado no programa argentino “Caiga Quien Caiga” (Caia Quem Cair). Com um tipo de jornalismo atrevido em combinação com um humor inteligente, o programa faz sucesso em vários países como: Itália, Espanha, Argentina e Chile.
Aqui no Brasil, com apenas 3 meses no ar, o CQC já o terceiro em audiência no horário. A equipe brasileira é composta por: Rafinha Bastos, Marcelo Tas, Marco Luque, Rafael Cortez, Danilo Gentili, Felipe Andreoli e Oscar Filho. Sete homens que se vestem de preto e estão sempre de óculos escuros, marca registrada do programa.
O jornalismo do CQC é bem diferente do que o público está acostumado a assistir. Para saber mais sobre a equipe, o Podcast, em parceria com Afonso Rodrigues (o blogueiro pop da Casa dos Ava) conversou por e-mail com dois dos integrantes do programa: o jornalista Rafael Cortez e o comediante Danilo Gentili.
ENTREVISTA COM RAFAEL CORTEZ
Podcast: O fato de ser ator ajuda nas matérias que você faz para o CQC ou não, são coisas completamente diferentes? Rafael: Ajuda muito. Creio que a direção do CQC levou isso em conta quando formou essa equipe. Não só na bancada e entre os repórteres. Todo mundo do CQC - câmera, produtores, redatores - tem uma formação profissional marcada pela diversidade de áreas em que atua. É preciso ser cada vez mais polivante nos dias de hoje. Ser ator no meio das entrevistas ajuda a desinibir, compor tipos e estimular o lado jornalístico que não é ensinado nas faculdades - lado que se vale do sarcasmo, cara-de-pau e mais fina ironia.
Podcast: Você recebe muitos recados na internet, dizendo "eu te amo", "você é lindo", "quer casar comigo?". Você já é reconhecido nas ruas? Como é a abordagem? E como é para você viver esse sucesso?
Rafael: Recebo esses recados sim. Mas eles são bem menos impactantes do que as mensagens que recebo com críticas construtivas e pequenos toques. Meu lado masculino/solteiro se envaidece desses elogios gratuitos e dessas cantadas todas de orkut. Mas sei que nada disso é concreto, pois as pessoas tendem a idealizar as figuras que aparecem na TV. No dia-a-dia, continuo só e bem introspectivo.
Faço de todo esse assédio um ótimo exercício pro meu reconhecimento pessoal. Nisso, entram lições de humildade e de pôr o pé no chão. No mais, sou reconhecido nas ruas que não fazem parte do meu bairro. Como saio muito pouco daqui (Vila Madalena, onde todo mundo já me conhece como vizinho do bairro, e não como o cara do CQC), não sinto tanto esse assédio físico; esse reconhecimento. Mas me empolgo quando vou à outras cidades e estados do Brasil para gravar. As pessoas são bem receptivas e conhecem muito o programa. Isso me felicita muito mais pelo fato de que o CQC atinge bem o Brasil do que pela iminência de ser uma pessoa famosa.
Podcast: Os fãs do CQC estão se interessando por seus outros trabalhos (músico, ator)?
Rafael: Muito. E isso está sendo sensacional. Tenho ficado com muita vontade de voltar a fazer teatro, dar recitais, compor e lançar o novo CD - bem como relançar o primeiro. Isso eu devo ao nosso público. O tesão do pessoal está alimentando o meu. E isso é coisa rara, porque perdi o tal tesão muitas vezes ao longo de tantas porradas na minha trajetória artística.
Podcast: O que você faz para conciliar o jornalismo com essas outras atividades?
Rafael: Atualmente só consigo me dedicar ao CQC. Até gravo áudio-livros e estudo meu violão, mas é tão light que nem conta. O CQC nem exige tanto assim de mim. Se compararmos com tantos trabalhadores brasileiros, minha carga de horas trabalhadas pelo programa é bem tranquila. Acontece que olhei pra 2008 e disse a mim mesmo que, neste ano, eu só queria fazer uma coisa, em muito bem-feita - o CQC. Sempre fiz 10 coisas ao mesmo tempo. Dei uma cansada. Mas sou tão ansioso e hiper-ativo que não tenho aguentado: no próximo semestre desse ano eu já vou fazer outras atividades sim. Mas com o programa como prioridade sempre!
Podcast: Como foi o processo de seleção para o CQC?
Rafael: Mandei um currículo meu para a produtora Cuatro Cabezas - Eyeworks, a responsável pelo CQC junto com a Band. Sabia que eles estavam procurando produtores para programas que trariam ao Brasil. Fui produtor de TV-Teatro e Circo por cerca de 10 anos. Me considero aposentado hoje, mas em outubro de 2007 bateu um medo de não ter trabalho nenhum... e acabei reconsiderando a idéia de produzir coisas pra sobreviver. Me chamaram para uma entrevista de emprego para um projeto ousado que estrearia em março de 2008. Me interei antes de ir à entrevista. Soube que era o CQC. Vi vários vídeos do programa na Argentina através do Youtube. E cheguei à tal reunião anunciando que em nada me interessava ser um dos produtores do programa. Que só toparia integrar a equipe como repórter. Os caras gostaram dessa cara-de-pau, que já era sinal de afinidade com o programa. Me deixaram fazer dois testes. Estudei muito para cada um deles. Passei.
Podcast: A que você atribui o sucesso meteórico do programa?
Rafael: Trata-se de uma mistura de elementos de sucesso: a bancada é um barato. Os repórteres dão um show de ousadia e são bem engraçados. A edição é ágil, moderna, ousada. A arte final é uma das coisas mais sensacionais já vistas na nossa TV. Agrada desde a criançada até os velhinhos. E, acima de tudo, o telespectador brasileiro é mais inteligente do que se pensava. Havia uma carência de humor inteligente. Quem ousasse primeiro pegava esse filão de gente. Ponto pro CQC, que teve visão e fez isso primeiro.
Podcast: Existe algum tipo de autocensura no CQC?
Rafael: Sim. A gente se preocupa o tempo todo em não cair no ridículo. Em não partir para a piada fácil ou cheia de preconceitos. Em não soar agressivos demais ou sem nenhuma noção. Isso é bem fácil e muito tentador de ser feito.
Podcast: Como você faz para se infiltrar nos eventos em que não se permite a entrada de repórteres?
Rafael: Quando isso acontece, é mérito de toda a equipe. As pessoas ignoram, por exemplo, que só entrevistei todos aqueles presidentes no Peru porque fui com um produtor excelente e um câmera ousado. Quando a gente fura um cerco ou consegue algo espetacular, o ponto é pra equipe toda. Por isso que no CQC não trabalham pessoas acomodadas, racionais demais ou passivas às regras. Temos mais de 50 malucos altamente profissionais e muitas vezes nada loucos na nossa equipe.
Podcast: Há algum tipo de discriminação por parte dos outros profissionais, que fazem o "jornalismo sério"?
Rafael: Já aconteceu no começo. Mas isso era fruto de um desconhecimento grande ainda acerca do que é o CQC e de como a gente trabalha. Coletivas de imprensa, por exemplo: atualmente é raro alguém se enfezar com a gente no meio delas. Até porque temos muita ética jornalística. Em geral, deixamos todos nossos colegas jornalistas fazerem suas perguntas antes de nós. Preferimos fechar o papo com o entrevistado em grande estilo. Mandamos a nossa questão e ainda descontraímos todo mundo.
Podcast: No CQTeste, o que te surpreendeu mais: a baixa pontuação do Nando Reis ou a alta pontuação da Mulher Melancia?
Rafael: Perguntinha capciosa essa, hein? Cheia de pequenos preconceitos acoplados... ora, a mulher melancia deveria ir tão mal porque é uma mulher gostosa e, portanto, pseudo-burra? E o Nando Reis surpreendeu ao ir mal porque seria um cara inteligente e, portanto, deveria acertar sempre? O CQTeste é uma brincadeira. Tem gente que vai muito bem porque responde rápido, ainda que erre tudo. E gente que vai mal demais porque pensou muito, levou tempo demais pra responder e se ferrou - ainda que tenha respondido tudo certo! O negócio alí é jogar a favor do relógio. Pouca gente entende isso. Isso inclui quem formulou essa pergunta, haha!
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ENTREVISTA COM DANILO GENTILI
Podcast: Você é publicitário de formação e o CQC é um programa jornalístico. Como foi essa transição? Como o CQC surgiu na sua vida?
Danilo: Eu sempre escrevi. E só fiz publicidade porque era a faculdade mais próxima do que eu realmente queria fazer (cinema, que é comunicação) e a única que eu conseguia pagar com o emprego lixo que tinha na época. Um dia apresentei num bar um texto de minha autoria. Riram. E daí pra frente fui fazendo comédia em vários lugares. E hoje vivo disso... A verdade é que nunca fui feliz e nunca me conformei fazendo coisas que eu não gostava e sempre busquei o que eu sempre quis fazer... Eu tomei muito na cabeça por isso e perdi outras coisas por isso. Mas, no fim das contas, estou feliz... Consegui alguma coisa...
Podcast: Como a sua experiência como comediante contribui nas matérias do programa? O que você leva do 'stand-up' para o CQC?
Danilo: Eu levo do stand-up pro CQC o raciocínio rápido que temos que ter nesse tipo de comédia. A observação minunciosa dos fatos... Do que nos rodeia... E levo a forma de raciocínio... Se não é uma piada, talvez não vale a pena ser dito.
Podcast: Você acha que, com o sucesso do CQC, a TV vai abrir mais espaço para o 'Stand-up Comedy'?
Danilo: A Globo, por exemplo, é uma emissora que percebeu que perdeu grandes talentos por ignorar os comediantes novos que fazem comédia em bar... Agora estão correndo atrás do prejuízo com o quadro no Faustão, onde comediantes stands-up competem entre si... E muitos ali são meus amigos... Outros eu vi começar... E outros ainda posso dizer que ajudei de certa forma... São todos ótimos... Acho que com o CQC as emissoras perceberam que o público quer um novo tipo de humor. E a única forma de ter esse novo tipo de humor é investimento e acreditando em novos comediantes.
Podcast: 1, 2.. pergunto: Er... Er... de onde surgiu a idéia do repórter inexperiente, um ícone do jornalismo brasileiro?
Danilo: Hauhauha!! Ele era um quadro do CQC orginal da Argentina. Mas claro que eu fiz do meu jeito aqui. Em nenhum outro país esse quadro fez tanto sucesso como aqui.
Podcast: Como está sendo o 'feedback' dos fãs? Já tem pôsteres seus saindo na Capricho? Já tem garotas com faixas '100% Gentili' na cabeça gritando seu nome? Gente se escondendo debaixo da cama do hotel ou acampando na porta de sua casa?
Danilo: AUHAUHAUHa!! Poxa... não sei se tenho fãs... O que percebo é que tenho amigos que se identificam comigo, com o que digo e me tratam com carinho... Me tratam às vezes até como um primo ou um vizinho conhecido da rua deles...
Podcast: Bem, a gente tentou ser engraçado nas duas perguntas anteriores, você deve ter percebido, mas humor não é pra todo mundo, como você também deve ter percebido. É difícil ser comediante no Brasil?
Danilo: É difícil ser comediante no Brasil porque brasileiro é muito hipócrita, complexado e idiota. Brasileiro é hipócrita. Adora fazer piadas politicamente incorretas as escondidas. Mas se faz isso em público, te crucificam só pra dizerem que são de moral excelente e você é o lixo. É uma forma de crescer em cima de você. Brasileiro sempre quer crescer em cima do outro... E isso porque é um povo complexado. Brasileiro se leva muito a sério. Se você brinca com a ferida deles, não aceitam... Só que o que mais esse povo tem é ferida... Deveriam cuidar mais disso...
Podcast: Você colabora com roteiro/pautas ou o programa tem uma equipe só pra isso?
Danilo: Sempre que tenho algo a acrescentar, eu passo a idéia pros colegas, seja do roteiro ou mesmo para os repórteres...
Podcast: O Padre Marcelo Rossi ensinou que devemos pedir a Deus toda manhã humildade, humildade, humildade, humildade... Aparentemente, o pessoal do Congresso não viu essa entrevista. Como está a campanha pelo CQC no Congresso?
Danilo: O Congresso só se lembra de ser humilde na época de eleição. Estamos barrados ainda no Congresso, o que me dá um certo nojo. Engraçado que político que todo mundo mete o pau como o [Paulo] Maluf, por exemplo, sempre fala com a gente... Já pessoas que se dizem sérias, que não tem nada a esconder, não falam... Pela lógica, o Maluf sim não tem nada a temer... Já os políticos que se dizem honestos, não sei não...
Nota: No programa de ontem, 30.06, foi anunciado pela bancada do programa que os repórteres do CQC já estão liberados para entrar novamente no Congresso Nacional. Ponto pra audiência do programa, que se mobilizou assinando o protesto online, enviando emails, cartas e telefonando para os parlamentares.
Podcast: Para concluir, a pergunta que não quer calar: Quanto a produção já perdeu de dinheiro no Teste de Honestidade?
Danilo: Aagyagyagyagyaa!! Mais que o meu salário!